Nossa leitura hoje estará dirigida para a Sagrada Escritura: A Bíblia Sagrada ou palavra de Deus. Abaixo você encontrará dados históricos sobre as origens das Escrituras, sua relação com a fé e com a História para que o seu conhecimento sobre a Palavra de Deus não esteja limitado à superfície.
A inspiração bíblica é uma graça dada por Deus a determinados homens e mulheres no seio do povo de Deus do Antigo e Novo Testamento, para tornar mais do legitimo e documentados, os mistérios de Deus e de sua influência na história dos povos, que Deus quis que os homens conhecessem para sua salvação. Resultando, assim, que “Deus é o autor principal do livro e o homem é o autor secundário e instrumental.” (cf. Concilio Vaticano II, Constituição Dei Verbum, 11).
Essencialmente necessária, a leitura da Bíblia Sagrada confere ao leitor faculdades que ajudam enormemente no entendimento de várias situações vividas no tempo pelo povo de Israel em sua trajetória de vida. Estas situações continuam vivas atualmente, mas de diferentes formas e contextos, porém a palavra de Deus é atual ontem, hoje e sempre.
Também abordaremos aqui o que é a práxis da lectio Divina enaltecendo a presença da Sagrada Escritura em nossas vidas.
O que você encontrará neste artigo:
– A História e a BíbliaTraduções da Bíblia
– A Septuaginta e a Vulgata
– A composição da Bíblia
– Ao ler a Palavra de Deus
– A Lectio Divina
– Como fazer a Lectio Divina?
A História e a Bíblia
Não se tem notícia de que exista alguma outra civilização da Antiguidade que manteve sua tradição literária tão intacta como Israel o fez com as Sagradas Escrituras. Quando observamos a evolução dos povos e sua cultura (ou patrimônio literário), destacamos o povo de Israel por ter cuidado sobremaneira da preservação do conhecimento daqueles símbolos que consideravam sagrados e que seriam motivos para a sua perseverança como nação em meios tão hostis.
A formação do Livro Sagrado, a Palavra de Deus viva, foi estruturada durante anos e anos, levando épocas inteiras onde os homens, em seu início, não possuíam os dons da escrita e comunicavam o conhecimento pela tradição oral, para as gerações futuras. Nas reuniões familiares e nas comunidades, aquilo que se presenciara ou que havia sido transmitido pelos antepassados, era agora renovado e transformado em consonância a cultura daquela época.
Com a evolução das civilizações, o uso da escrita começa a ganhar presença nas comunidades, ainda de maneira inexata ou parcial, mas perseverante e crescente até que os escritos começam a possuir mais volume e serem ampliados para obras completas. Durante sua evolução muito se é alterado e transformado.
Através das citações bíblicas da liturgia e dos escritos dos primeiros cristãos é possível seguir o curso da transmissão textual até os séculos II. E os papiros mais antigos, com textos do Novo Testamento, procedem do século II e III. Entre os mais notáveis se encontram um papiro contendo os versículos do texto de Jo 18,31-33, escrito antes do ano 150; o Papyrus Bodmer II contém quase íntegros os 14 primeiros capítulos de São João e foi escrito antes do ano 200.
A transmissão textual dos livros da Sagrada Escritura, desde que foram escritos até hoje, é mais fiel que a de qualquer outro livro que nos tenha chegado da antiguidade. E as razões são fáceis de compreender: estes livros foram considerados sagrados por muitos homens – judeus e cristãos – e, portanto, o cuidado em conservá-los, não mutilá-los e transcrevê-los com exatidão é superior comparado a qualquer outro tipo de livro profano. Daí deriva que tenhamos versões muito antigas da Sagrada Escritura. Versões que hoje podemos comparar com as atuais, e que mostram uma substancial identidade.
Do Antigo Testamento, depois da descoberta dos Manuscritos de Qumram em 1947, temos versões da maioria dos livros do Antigo Testamento, alguns anteriores ao século II a.C. Do Novo Testamento, os manuscritos que estão próximos ao texto antigo são bem numerosos. Somente os manuscritos gregos são mais de 4.000, e os mais antigos remontam ao século IV e V. Os mais notáveis são o Códice Vaticano, o Sinaítico e o Alexandrino.
A partir então do primeiro século Cristão, os escritos passam a receber especial atenção para que fossem preservados em sua integridade, mantendo sua originalidade.
Daí justifica-se que tenhamos versões muito antigas da Palavra de Deus. Versões que hoje é possível comparar com as atuais, e que apresentam uma interessante identidade.
Assim, sendo a Bíblia Sagrada a Palavra de Deus escrita, como toda obra literária de uma nação passa pelo processo de evolução “nascendo” provavelmente no século XI a.C. e recebendo sua letra definitiva ao final do século1 d.C.
Traduções da Bíblia – A Septuaginta e a Vulgata
Como dissemos acima a Bíblia é histórica e seu início se deu pela tradição oral para depois ser transcrita para o Aramaico, língua daquela região.
A Septuaginta
A mais antiga tradução da Bíblia em forma escrita é a Septuaginta, que foi feita ao longo dos últimos 200 ou 300 anos antes de Cristo.
É uma tradução do Antigo Testamento hebraico para o grego, feita no Egito, para a comunidade judaica que não mais entendia o texto bíblico em hebraico após anos e anos de escravidão nas terras dos faraós.
A Septuaginta inclui também alguns livros que foram, originalmente, escritos em grego. O termo “Septuaginta” significa “Setenta” e é derivado da tradição de que foram 72 sábios de Israel (seis de cada tribo) que fizeram a tradução, a pedido do rei do Egito.
A Septuaginta foi a versão da Bíblia utilizada por muitos dos primeiros cristãos, inclusive apóstolos e evangelistas. Nas cartas de Paulo, por exemplo, uma de cada três citações do Antigo Testamento parece ter sido tirada diretamente da Septuaginta. Além disso, a Septuaginta ajuda a entender a linguagem do Novo Testamento, em especial o novo significado de palavras em grego.
A Vulgata
O termo vulgata tem origem na palavra latina vulgus, que significa “multidão” ou “público”. A Bíblia Vulgata, portanto, foi feita com a intenção de ser a edição comum a todo o Ocidente dos textos bíblicos.
A tradução mais importante ao latim é a (Vulgata), feita pelo eminente biblista São Jerônimo, no final do quarto século e começo do quinto século (mais ou menos 400 d.C.). Tudo indica que Jerônimo fez apenas uma revisão do texto latino do Novo Testamento.
No caso do Antigo Testamento, fez uma nova tradução a partir do original hebraico (que ele chamava de veritas hebraica, ou “verdade hebraica”), pois as traduções latinas existentes na época haviam sido feitas a partir da Septuaginta grega. Para fazer uma tradução de qualidade e fiel aos originais, Jerônimo foi à Palestina, onde viveu durante 20 anos.
Estudou hebraico com rabinos eruditos e estudou todos os manuscritos que conseguiu localizar. A tradução feita por Jeronimo foi denominada como “Vulgata”, ou seja, a tradução “divulgada” ou “difundida”. Embora não tenha sido inicialmente assumida como verdadeira e inspirada (afinal, era diferente das outras traduções conhecidas na época), tornou-se o texto oficial do cristianismo ocidental. Neste formato, a Bíblia difundiu-se por todas as regiões do Mediterrâneo, alcançando até o Norte da Europa.
As traduções anteriores para o latim, questionadas quanto a sua autenticidade e fidelidade, eram elaboradas a partir da cultura de cada região e de seus costumes. Santo Agostinho dizia que “qualquer pessoa que possuísse em mãos um manuscrito grego e conhecesse o latim se lançava ao desafio de traduzir os textos Sagrados”.
O texto das traduções feitas por São Jerônimo apresentava três qualidades importantes, que garantiram que a sua versão fosse definida como a versão mais utilizada pela Igreja:
A primeira é qualidade e a clareza de exposição.
De certa forma, é possível afirmar que nenhum dos tradutores anteriores conseguia expressar a fidelidade dos sentidos dos textos como jerônimo. Não somente tomando literalmente as traduções, Jeronimo se utilizava de recursos para poder deixar mais palatável e fiel ao leitor, os textos. Acrescentava uma palavra, traduzia os nomes hebraicos pelo seu sentido etimológico e usava expressões populares ou mitológicas.
A segunda qualidade é a fidelidade da tradução.
Para obter o sentido real do texto original, era comum que São Jerônimo consultasse várias versões, para após isto prosseguir com a tradução para o Latim.
A terceira qualidade é a elegância no escrever.
São Jeronimo tinha o cuidado de avaliar as frases em hebraico e se elas parecessem vulgares ou soassem mal em Latim ele as trabalhava para que ficassem mais belas e fossem absorvidas com naturalidade.
Em 1546, o Concílio de Trento, declara a Vulgata como o texto oficial da Igreja Católica, uma vez que este era o texto mais em prática pela Igreja há mais de um milênio. O decreto Insuper do Concílio de Trento dizia:
“Insuper eadem sacrosancta Synodus, considerans non parum utilitatis accedere posse Ecclesiae Dei, si ex omnibus latinis editionibus, quae circumferuntur sacrorum librorum, quaenam pro authentica habenda sit, innotescat: statuit et declarat, ut haec ipsa vetus et vulgata editio, quae longo tot saeculorum usu in ipsa Ecclesia probata est, in publicis lectionibus, disputationibus, praedicationibus et expositionibus pro authentica habeatur, ut nemo illam reiicere quovis praetextu audeat vel praesumat.”
”Além disso, o mesmo Sacrossanto Concilio, considerando que não pouca utilidade poderia advir à igreja de Deus, se de todas as edições latinas dos Livros Santos que por
ar circulam se reconheça a qual se deva ter por autêntica, decreta e declara que esta mesma
antiga e divulgada (vulgata) edição, que foi consagrada pelo uso na mesma igreja ao longo de tantos séculos, seja lida por autêntica nas Lições, discussões, pregações e exposições publicas; e que ninguém a ouse ou presuma repudiar, seja a que pretexto for.”
Com o desenvolvimento dos estudos bíblicos, foi sendo preparada uma revisão da Vulgata e, somente em 1979 ela foi substituída pela Nova Vulgata, que é uma tradução mais acurada, entretanto, sem deixar de ter como base a tradução de São Jerônimo.
A composição da Bíblia
A Bíblia está dividida em duas grandes partes: O Antigo Testamento e o Novo testamento, num total de 73 livros como inspirados por Deus.
No Antigo Testamento os hebreus a dividiram em três partes, em 46 livros:
• Torah, ou Pentateuco (Livros Históricos);
• Nabyym ou Profetas (Livros Proféticos);
• Kethubyn ou outros escritos (Livros Didáticos ou Sapienciais – alguns chamados também poéticos).
Já no Novo Testamento temos 27 livros sendo os livros históricos os quatro Evangelhos – também chamados de Sinópticos – Mateus, Marcos, Lucas, João e o livro dos Atos dos Apóstolos.
Já como Livros proféticos, se tem o Apocalipse de São João.
São livros didáticos ou sapienciais as epístolas de São Paulo e as epístolas católicas dos demais Apóstolos.
Chamamos de Cânon bíblico (a palavra cânon significa cana ou vara – daí derivou a ideia de instrumento para medir, regra ou medida) como, metaforicamente, tudo aquilo que serve como norma ou regra para fazer algo. O cânon católico foi definitivamente fixado no Concílio de Trento.
Ao ler a Palavra de Deus
A Bíblia é um livro revelado por Deus ao seu povo, a seus fiéis. Assim ela necessita ser lida e relida com critérios que validem esta premissa de sua santidade e importância como nos fala o Concilio Vaticano II:
“A Escritura deve ser lida com o mesmo espírito com que foi escrita: portanto, para descobrir o verdadeiro sentido do texto sagrado é preciso levar em conta o conteúdo e a unidade de toda a Escritura, a Tradição viva de toda a Igreja, a analogia da fé. Aos exegetas toca aplicar estas normas em seu trabalho para ir penetrando e expondo o
sentido da Sagrada Escritura, de modo que com dito estudo possa amadurecer o juízo da Igreja. Todo o dito sobre a interpretação da Escritura fica submetido ao juízo definitivo da Igreja, que recebeu de Deus o encargo e o ofício de conservar e interpretar a palavra de Deus” (Constituição Apostólica Dei Verbum, 12)
A palavra de Deus deve ser buscada todos os dias não somente como uma leitura de uma obra histórica, mas sim como a verdadeira palavra de Deus revelada ao homem por sua benevolência e misericórdia.
O grande Papa Pio X, hoje Santo, já postulava:
“Nós, que tudo queremos instaurar em Cristo, desejamos com o máximo ardor que nossos filhos tomem o costume de ler os Evangelhos, não dizemos frequentemente, mas todos os dias, pois é principalmente por este livro que se aprende como tudo pode e deve ser instaurado no Cristo… O desejo universalmente esparso de ler o Evangelho, provocado por vosso zelo, deve ser secundado por Vós, na medida em que se aumentar o número dos respectivos exemplares. E Oxalá jamais sejam propalados sem sucesso! Tudo isso será útil para dissipar a opinião de que a Igreja se opõe à leitura da Escritura Sagrada em língua vernácula ou lhe suscita alguma dificuldade” (Revista PR, Nº 11, Ano 1958, Página 452).
A Lectio Divina
O termo Lectio Divina pode ser traduzido como Leitura Divina ou Leitura Orante da Sagrada escritura e tem origem milenar nas raízes na religião e tradição judaica. Os rabinos tinham o hábito de, nas sinagogas, ler de forma orante a Torah, os Escritos e Profetas, meditando as passagens. Os princípios da Lectio Divina foram expressos por volta do século I e praticados por monges católicos, especialmente as regras monásticas dos santos: Pacômio, Agostinho, Basílio e Bento. Santa Terezinha Do Menino Jesus dizia, em período de aridez espiritual, que quando os livros espirituais não lhe diziam mais nada, ela busca no Evangelho o alimento de sua alma.
Por volta do ano de 1.150 d.C., um monge chamado Guigo, enquanto trabalhava em seus afazeres, meditava na profundidade da vida espiritual quando se sentiu inspirado e imaginou um método eficiente de ler a palavra de Deus.
Ele escreveu um livro chamado “A escada dois monges” onde são definidos quatro estágios, simples mais efetivos, para crescimento na vida espiritual ao ler a palavra de Deus, que foram conhecidos como degraus espirituais. São estes degraus (ou estágios):
– (Lectio) A leitura da palavra de Deus;
– (Meditactio) A meditação da leitura
– (Oratio) A Oração pós-meditação;
– (Comtemplatio) A contemplação.
No Concílio Vaticano II, conclamado por São Joao XXIII e concluído por São Paulo VI, em seu decreto Dei Verbum 25, revive esta prática esta prática foi recuperada e revivida, praticada nos mosteiros (sobretudo beneditinos). Mas esquecida pelo povo.
Como fazer a Lectio Divina?
Um bom método para fazer a Lectio Divina é o que segue abaixo:
Preparação: Invocação do Espírito Santo (Vinde Sanctus Spiritus). Faça a Oração da Igreja clamando ao Espírito Santo que venha a seu socorro e abra seu coração à graça Divina.
Leitura. Leitura calma e atenta de algum trecho da Palavra de Deus. No início é recomendado ler trechos do novo testamento. Procure identificar as coisas importantes que você capturou na leitura: Locais, o ambiente, os personagens, as imagens usadas, os diálogos e as ações. Procure entrar no clima e sentir a palavra entrando em sua mente e seu coração, sem pressa, mas com amor e respeito.
Meditação. Ela não se limita a superfície da palavra, mas vai mais fundo, penetra na alma. Mergulha em cada aspecto. Aqui busca-se o entendimento comparando o que se leu a sua vida, às suas experiencias, sua vivência e deixando-se levar pela graça divina.
Oração. Lembre-se que toda boa meditação deverá desaguar na oração. Este é o momento de abrir o diálogo com Deus através de sua oração sincera e verdadeira. Não se trata de usar fórmulas prontas, mas sim elaborar uma oração pessoal que determina a sua vontade em estar em Deus e com Deus.
Não se preocupe em elaborar palavras e frases de efeito; fale o que está em seu coração após a meditação: se for louvor, pedido de perdão, pedir a luz de Deus para clarear suas veredas ou ainda pedir os dons da fé e esperança.
Contemplação. Aqui é o poder do Espírito Santo que rege o momento. Está aqui a presença de Deus. Se assim for concedido, o orante será conduzido à contemplação, ou apenas a tranquilidade de momentos de paz e silêncio e, talvez, alguns instantes de esforço para ficar na presença de Deus.
Deo Gratias!