A Igreja da Ordem Terceira do Carmo, situada na Avenida Rangel Pestana, em São Paulo, é um marco de 393 anos de devoção e história, erguido em 1632 sob a proteção de Nossa Senhora do Carmo.
Este templo barroco, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), é mais do que um monumento; é um santuário vivo onde a fé dos antepassados paulistanos ecoa nas preces entalhadas em suas paredes.
Testemunha de eventos como a Independência do Brasil e visitas imperiais, a Igreja do Carmo guarda relíquias da Ordem Terceira, altares dedicados à Paixão de Cristo e pinturas de mestres como Pedro Alexandrino.
Para os fiéis, ela é um convite à espiritualidade carmelita, simbolizando a proteção do Escapulário Castanho e a intercessão de Maria.
Neste artigo, compartilhamos a descrição completa deste patrimônio, extraída do livro Carmo – patrimônio da história, arte e fé de Raul Leme Monteiro, celebrando sua relevância espiritual e cultural.

Dentre os templos de São Paulo, um existe que merece, sem dúvida alguma, toda a nossa veneração especial. A vetusta Igreja da Avenida Rangel Pestana, contando 345 anos de existência, presidiu a vida, o crescimento, a grandeza e a prosperidade da nossa cidade, metrópole soberba e magnífica.
Ela é um documento autêntico de piedade e de religião dos nossos antepassados, que dignifica o sentimento religioso de nossa gente e valoriza o nosso patrimônio histórico; bem representa os traços, da fisionomia e a fé cristã dos nossos maiores, concretizados para a posteridade.
Nas suas paredes, argamassadas pelos suores dos cristãos fiéis, estão incrustadas preces que ainda falam a Deus, dia e noite. Nas suas linhas entrelaçam-se a arte, o engenho, o encanto que dão o relevo da estética. Cheia de nobrezas e de altos brasões é a Igreja de Nossa Senhora do Carmo, conhecida simplesmente como Igreja do Carmo.
Ela é a mais perfeita e lídima expressão arquitetônica do estilo colonial e da arquitetura barroca; é a mais legítima expressão da religião católica; nasceu na fé, e na fé se inspirou; é uma das poucas reminiscências da grandeza e do fausto de São Paulo antiga; é uma riqueza do nosso paupérrimo patrimônio artístico.
A Igreja do Carmo é o retrato de uma fase da vida de São Paulo ligada historicamente à formação da cidade. Ela assistiu aos desdobramentos da sua pujança e figurou com o maior destaque em todos os acontecimentos e em todas as vicissitudes por que passou esta cidade fundada por Manoel da Nóbrega.
Nela celebraram-se pomposamente os diversos episódios do primeiro e segundo Impérios e da República. Os seus sinos repicaram festivamente na Independência do Brasil e na Proclamação da República.
No dia da proclamação da Independência foi visitada por D. Pedro I.
No dia 12 de abril de 1846 recebeu com deslumbrantes solenidades o Imperador do Brasil, D. Pedro II, e a Imperatriz D. Thereza Christina; as poltronas em que eles se sentaram estão até hoje guardadas no Salão Nobre como preciosa relíquia.
Nela foram sepultados os fundadores da Ordem, bandeirantes, Pedro Dias Pais Leme, Pedro Taques de Almeida, Brigadeiro Francisco de Paula Macedo, Padre Diogo Feijó, Líbero Badaró e muitos outros ilustres Irmãos Terceiros do Carmo.

Nela celebraram-se as mais célebres e empolgantes novenas, tríduos e festas religiosas; dela saíram as conhecidas procissões que tinham a importância e a imponência de festas nacionais às quais o povo acorria com fervor e patriotismo.
A sua construção teve início no ano de 1632, ao lado da Igreja do Carmo dos Padres Carmelitas, na Esplanada do Carmo, depois do Largo do Carmo, hoje Avenida Rangel Pestana. Reinava gloriosamente o Santo Padre Urbano VIII; D. Felipe III (IV da Espanha), era, então, Rei de Portugal. Segundo a História, foi construída em poucos anos graças às generosas contribuições dos primeiros irmãos da nossa Ordem.
Na fachada principal, de muita simplicidade, vê-se um ático composto por um frontão revoluteado barroco, tendo ao centro o emblema da Ordem 3ª do Carmo em alto relevo sobreposto a uma envasadura; encimando o ático uma cruz de granito flanqueada por dois coruchéus.

É soberbo de magnificência o altar-mor barroco de grande valor pela elegância das formas, severidade das linhas, beleza e sobriedade nos ornatos, perfeição e harmonia em todas as suas partes, erguendo-se numa ascensão para o céu, onde está entronizada a Padroeira do Carmo; guarnecido por duas colunas de cada lado, com suas bases, fustes e capitéis cheios de lavores, entre elas estão incrustados os nichos que sustentam as imagens dos grandes santos carmelitanos São João da Cruz e Santa Teresa; salienta-se bem ao alto o emblema da Ordem Carmelitana, magnificamente decorado; o barroco exaltado pelos entalhes dourados apresenta uma elegância incomparável; suas linhas estilizadas traduzem toda a veneração dos fiéis e dão uma característica especial às solenidades do culto.

A capela-mor é separada da nave por um arco em semi-círculo que sustenta riquíssima sanefa notável pela exuberância decorativa, em cujo centro está afixado o emblema da Ordem Carmelitana, simbolizando as suas belezas místicas e espirituais; pintados a ouro os seguintes dizeres: “IN HONOREM BEATISSIMAE VIRGINIS MARIAE DE MONTE CARMELO”.

Magníficos são os sete altares laterais que se erguem sob a nave, trabalhos de insignes artistas, dedicados à Paixão de Jesus Cristo, com as respectivas imagens representando a partir do lado direito: 1°, JESUS NO HORTO; 2°, JESUS NA PRISÃO; 3º, JESUS ATADO À COLUNA; 4°, JESUS COROADO DE ESPINHOS: 5°, ECCE HOMO; 6, JESUS COM A CRUZ ÀS COSTAS; 7%, JESUS NO CALVÁRIO. Este último altar foi mandado construir em 1684, e oferecido pelo Irmão Terceiro Pedro Taques de Almeida, Capitão-mor e Governador da Província de São Paulo; em 1803 foi retirado e colocado no Consistório, permanecendo somente a cruz. Em 1886 foi retirado do Consistório e instalado na Capela do Cemitério, onde hoje se encontra.

Cortados em preciosa madeira erguem-se os dois púlpitos, as tribunas sagradas; ostentam finos lavores nos relevos; nelas pregaram os grandes oradores sacros Monsenhor Camilo Passalacqua, Pe. Julio Maria, Frei Francisco Mont’ Alverne, Pe. Luiz Gonzaga Cabral S. J., Pe. João Gualberto, Pe. José Danti S. J., Pe. Madureira S. J., Pe. Arlindo Vieira S. J., Pe. Mestre Peres, Pe. Bernardo Cabrita, D. Sebastião Leme, D. Lino Deo- dato de Carvalho, D. Joaquim Arcoverde de Albuquerque Cavalcanti, D. José Camargo Barros, D. Duarte Leopoldo e Silva, D. Jayme de Barros Camara, D. José Gaspar Afonseca, D. Carlos Carmelo de Vasconcelos Mota, D. Paulo de Tarso Santos, D. Gastão Liberal Pinto, D. Agnello Rossi, Monsenhor Manfredo Leite, D. Paulo Evaristo Arns e outros notáveis pregadores da Igreja.
Ilustra o forro pomposo e exuberante da capela-mor belíssima pintura de Pedro Alexandrino (1730-1810) executada em 1760 pelo genial artista, simbolizando a condecoração de Santa Teresa com um colar de rosas pela Virgem Maria e seu Divino Filho.

O forro da nave guarda ciumentamente a pintura dos quatro Evangelistas, dos Doutores da Igreja e dos Santos da Ordem Carmelitana, feita em 1798 pelo Padre Jesuíno do Monte Carmelo … (1764-1818), que é inegavelmente um quadro dos mais lindos da arte pictórica brasileira. O painel central da nave foi pintado em 1899, por Pedro Alexandrino, o Moço (1860-1941).
Expostas à veneração dos fiéis, encontram-se assentados em nichos encimados por ricas sanefas as imagens do Sagrado Coração de Jesus, Santo Antônio, São Vicente de Paulo, São José, São Judas Tadeu, Santa Teresinha, São João Evangelista e Nossa Senhora das Dores.

O portal e as portas internas, solenes, majestosas, o cadeiral e todas as cadeiras do Salão Nobre, são lavradas no nobre e aristocrático jacarandá da Bahia. O pavimento é parte do mesmo jacarandá e parte de mármore.
Na entrada do templo está assentado, na parte superior, um grande órgão.
A torre deste maravilhoso templo de Deus sobe para o azul do firmamento e dentro dela estão os sinos de bronze doados por irmãos terceiros, chamando a cidade para o culto divino.
A opulência paulista está largamente representada nesta igreja a dominar a cidade tumultuosa que se vai pejando de arranha-céus.
Eis, nestas poucas linhas, a descrição desse maravilhoso templo, patrimônio da história, de arte e de fé, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que nós, terceiros carmelitas, humildes servos de Deus, o conservamos carinhosamente desde 1632 com os nossos recursos próprios, sem ajuda de quem quer que seja, para mostrar ao Brasil e à cristandade nossos foros de crença três vezes secular, e dizer à geração de agora e às gerações futuras que o segredo propulsor da grandeza do nosso sodalício descansa na brasa da nossa fé em Deus e crença na Igreja Católica para a qual sempre trabalhamos e continuaremos a trabalhar sem cessar.
(Livro: Carmo – patrimônio da história, arte e fé; Raul Leme Monteiro).